Em decisão monocrática, o desembargador Carlos Alberto França (foto) manteve, parcialmente, liminar deferida pelo juiz de Campinorte, Samuel João Martins, para que o Estado de Goiás, por meio da Superintendência Executiva da Administração Penitenciária (Seap), proceda, no prazo de 30 dias, a lotação de seis agentes penitenciários na unidade prisional da cidade, cuja gestão tem sido feita, indevidamente, por policiais militares.

Para o desembargador, não é aceitável o argumento do Estado de Goiás de que a decisão do magistrado singular esvazia a ação civil pública ajuizada pelo Ministério Público do Estado de Goiás (MPGO). Os representantes estatais invocaram o artigo 1º, parágrafo 3º da Lei nº 8.437/92, segundo o qual  “o recurso voluntário ou ex officio, interposto contra sentença em processo cautelar, proferida contra pessoa jurídica de direito público ou seus agentes, que importe em outorga ou adição de vencimentos ou de reclassificação funcional, terá efeito suspensivo”.

De acordo com Carlos França, o próprio Superior Tribunal de Justiça (STJ) admite exceções a esse comando legal, que diz respeito às liminares satisfativas irreversíveis, ou seja, àquelas cuja execução produz resultado prático que inviabiliza o retorno do status quo ante (o estado em que as coisas estavam antes), em caso de sua revogação.

O desembargador ressaltou que o próprio juiz, na decisão vergastada, frisou que, em virtude da vedação contida no artigo 3º da Lei nº 8.437/92 e da atual responsabilidade e total incumbência da Polícia Militar na gestão do estabelecimento prisional, o restabelecimento da situação anterior certamente encontraria obstáculos que poderiam agravar a situação dos presos, razão pela qual indeferiu liminar pedida pelo MPGO, que pedia que Seap assumisse a cadeia de Campinorte.

“Ora, se o julgador singular, com base em documentos que lhe são apresentados, vivenciando, ademais, a realidade da cadeia pública de Campinorte e o comportamento da segurança dos municípios, em razão da utilização tão só do efetivo da Polícia Militar, que, ao ficar obrigado a custodiar os detentos, acaba prejudicando o patrulhamento ostensivo nas ruas, a liminar parcialmente deferida deve ser prestigiada, mormente quando seriíssima a relevante fundamentação expendida para decidir”, observou Carlos França.

Separação de Poderes

Quanto à alegação de que o juiz de Campinorte, ao deferir a liminar para determinar “uma série de providências de natureza exclusivamente administrativa”, ofendeu o princípio da separação dos poderes, o desembargador entendeu que não houve ingerência do Poder Judiciário neste caso, pois sua atuação discricionária limita-se ao dever da boa gestão administrativa, bem como ao cumprimento e garantia de direitos constitucionais e legalmente protegidos, o que é passível de controle pela Justiça.

Segundo Carlos França, o Supremo Tribunal Federal (STF) é enfático ao repudiar a omissão do Estado, quando este deixa de cumprir, em maior ou menor extensão, a imposição ditada pelo texto constitucional. Com isso, ele observou, o STF tem proferido decisões que neutralizam os efeitos nocivos da inatividade governamental, em situações nas quais essa omissão representa um insulto aos direitos básicos assegurados pela Constituição.

O desembargador refutou o argumento do Estado de que não poderia cumprir a decisão, pois enfrenta graves problemas orçamentários, motivo pelo qual promoveu reforma administrativa com intuito de enxugar gastos. Há desrespeito da administração em cumprir a Constituição, ele observou, “e é por isso que o Judiciário é provocado a decidir, para fazer cumprir os preceitos que se alega desrespeitados”.

Multa diária
O desembargador Carlos França, entretanto, modificou a decisão quanto a aplicação de multa diária de R$ 1 mil ao governador do Estado e ao secretário de Segurança Pública, já que não fazem parte da relação processual e, por isso, não podem ser diretamente responsabilizados pelo cumprimento da decisão proferida em primeira instância. Segundo ele, isso afrontaria os princípios do contraditório, da ampla defesa e do devido processo legal. Com isso, o Estado de Goiás passa a responder pela multa fixada na decisão recorrida. (Texto: Aline Leonardo - Centro de Comunicação Social do TJGO)