Por unanimidade de votos, a 1ª Câmara Criminal do Tribunal de Justiça de Goiás (TJGO) decidiu que seis policiais envolvidos no caso da desocupação do Setor Parque Oeste Industrial  - quando duas pessoas morreram e outras 12 ficaram feridas - não serão julgados por júri popular. O relator do caso foi o desembargador Nicomedes Borges (foto).

O colegiado votou pela impronúncia dos oficiais, mantendo a decisão proferida em primeiro grau pelo juiz Jesseir Coelho de Alcântara, da 1ª Vara Criminal de Goiânia. Inconformada, a assistência da acusação, contratada pelas vítimas e por suas famílias, apelou da sentença.

É que, para a pronúncia - decisão que manda o réu a júri popular - é necessário que existam a materialidade do crime e indícios da autoria. Segundo Nicomedes, apesar de a materialidade dos crimes ter sido comprovada pelos laudos de exames cadavéricos, as autorias dos homicídios e tentativas de homicídio não ficaram suficientemente demonstradas, já que nem mesmo as testemunhas e vítimas conseguiram identificar os autores dos disparos.

“A instrução criminal não logrou fornecer ao julgador elementos seguros hábeis a respeito de quem tenham sido os autores ou os responsáveis pelos disparos de arma de fogo que atingiram as vítimas, já que centenas de policiais participaram da operação. (…) Nada nos autos traz o menor indício de que os acusados tenham sido os autores dos crimes”. A decisão está em consonância com o pedido do Ministério Público, que, ao final do processo, também se manifestou a favor da impronúncia dos réus.

No voto, o magistrado citou trechos da sentença proferida por Jesseir, segundo quem "embora para a pronúncia baste a suspeita jurídica derivada de um concurso de indícios, devem estes ser idôneos, convincentes e não vagos, duvidosos de modo que a impronúncia se impõe quando de modo algum possibilitariam  o acolhimento pelo júri".

O desembargador lembrou, também, relatos de testemunhas, como Elcílio Gonçalves, que afirmou ser "impossível reconhecer qualquer um dos policiais que entraram na ocupação, nem aqueles que o agrediram ou a qualquer outra vítima, que os policiais já entraram atirando, mas não pode indentificar nenhum". 

 Entenda o caso

No dia 16 de fevereiro de 2005, por volta das 8h30, cerca de 1863 policiais militares chegaram na ocupação Sonho Real, iniciando o fechamento de trânsito nas adjacências. Logo em seguida, iniciaram ação de adentramento na invasão, conforme plano de operação elaborado pela polícia.

Segundo a denúncia, a entrada dos agrupamentos de choque foi violenta, com os policiais usando camuflagem (pintura com tinta preta e verde) no rosto e com a tarjeta identificadora escondida. Os pelotões comandados teriam entrado na invasão desferindo tiros com projéteis de borracha e letais, lançando bombas de efeito moral contra os invasores que estavam nas barricadas.

Foram acusados o tenente-coronel José Divino Cabral; sargento Rorion Alves Martins, tenente Wendel de Jesus Costa, capitão Alessandri da Rocha Almeida, capitão Wilmar Rubens Alves Rodrigues e tenente Eduardo Bruno Alves. Os cinco primeiros foram denunciados por omissão, homicídio qualificado (com uso de recurso que impossibilitou a defesa da vítima) e tentativa de homicídio, enquanto o último foi acusado de tortura.

A ementa recebeu a seguinte redação: Apelação. Homicídio e Tentativa de Homicídio Qualificado. Recurso do Assistente de Acusação. Razões Recursais Extemporâneas. Mera Irregularidade Formal. Impronúncia. Legitimidade para recorrer. Ausência de Indícios de Autoria. Decisão Mantida. 1- A apresentação tardia das razões recursais configura mera irregularidade, não sendo capaz de obstaculizar o conhecimento da pretensão recursal. 2 – O artigo 271 do Código de Processo Penal atribui legitimidade ao assistente de acusação para, supletivamente, na omissão do Ministério Público, interpor recurso de apelação nos casos de impronúncia (CPP, art. 584, § 1º). 3-Para motivar a pronúncia, o indício deve se mostrar real, ser necessariamente provado e aproximar-se da certeza sem, contudo, excluir a dúvida. A mera possibilidade de autoria, sem fundar-se em fatos concretos e minimamente seguros, torna a impronúncia medida impositiva. Apelo Conhecido e Desprovido. (Apelação Criminal nº 200592776875) (Texto: Lilian Cury - Centro de Comunicação Social do TJGO)