O juiz Wilson Dias da Silva, da Vara de Execução de Penas e Medidas Alternativas de Goiânia, considerou inconstitucional o indulto natalino para o caso de uma pena restritiva de direito, consistente em prestação de serviços à comunidade e multa. Para o magistrado, o benefício deve ser aplicado apenas aos réus que foram sentenciados à privação de liberdade, uma vez que as razões históricas nacionais remetem a uma política contra a superlotação de presídios.

Para embasar a sentença, Wilson Dias explicou que o indulto consiste, essencialmente, no perdão da pena, e rememorou as origens históricas da medida, conferida como uma prerrogativa de perdoar e aliviar os excessos do direito formal. O juiz, inclusive, comparou aplicações do benefício em vários Países para entender o contexto nacional. “Na Alemanha, Estados Unidos, Inglaterra, Portugal, Espanha, Itália e França, o chefe de Estado somente detém competência para conceder o perdão em caráter individual, O estudo do instituto na história e no direito comparado, portanto, revela que o indulto foi originalmente concebido como um ato de clemência do soberano, fazendo-se desaparecer, ao longo do tempo, nos países democráticos mais avançados”.

No Brasil, diferente das nações citadas, o indulto é um ato de competência do presidente da República e tem caráter geral, sendo concedido em dezembro desde 1988, ganhando, assim, o nome de indulto natalino. “A análise dos decretos de indulto natalino revela uma tendência de abrandamento nos requisitos para a concessão do perdão presidencial, sendo certo que esse progressivo alargamento ao longo dos anos foi tradicionalmente associado à necessidade de enfrentamento do problema do hiperencarceramento no País”.

Dessa forma, Wilson Dias concluiu que o indulto natalino não é apenas “um ato de clemência do chefe do Poder Executivo, mas também um instrumento da política criminal brasileira. Assim, no direito brasileiro, diferentemente de outros países, o indulto coletivo não foi extinto. Pelo contrário: o uso desse instituto foi ampliado ao longo do tempo, sob a justificativa de compor a política criminal e penitenciária”.

Se o objetivo brasileiro do indulto natalino é combater a lotação nas penitenciárias, não há sentido de estender o benefício a sentenciados com penas de prestações de serviços comunitários e multa, como no caso do autor da ação, na concepção do magistrado. “No que se refere à pena restritiva de direitos, e multa, o perdão da pena não se justifica à luz das finalidades próprias do instituto do indulto. A uma, porque a reinserção social já foi satisfatoriamente estimulada por outros meios, menos gravosos do que a prisão. A duas, porque o indulto não se justifica como medida alternativa, já que o sujeito não se encontra encarcerado, sob pena de instituir uma 'alternativa a alternativa a prisão', ou seja, uma alternativa binária ou múltipla”.

O juiz ainda completou que no caso em análise, uma vez que o autor não chegou a ser encarcerado, “não há efeitos benéficos de caráter humanitário – pois o indultado não sofre as agruras do cárcere – nem econômico-social – porquanto a medida não reduz a superlotação dos presídios. O único efeito prático é a liberação de todos os efeitos da condenação, sem que, em contrapartida, se observem ganhos normalmente atribuídos ao indulto. Refiro-me, particularmente, ao atendimento das funções da pena”.

Sobre a multa, o magistrado ainda defendeu que a sanção possui, como destino, o Fundo Penitenciário, isto é, para a própria estrutura do cárcere. “Logo, a concessão de indulto para a multa aborta sua própria existência”.

Os efeitos da sentença afetam apenas o caso em questão, no qual o autor havia sido sentenciado por porte de drogas (Lei art. 33°, parágrafo 4° da Lei Federal n° 11.343/06), a um ano e oito meses de reclusão, substituídas prestação de serviços à comunidade e prestação pecuniária. O objetivo dele era ser beneficiado com o indulto natalino. Veja sentença. (Texto: Lilian Cury – Centro de Comunicação Social do TJGO)