Os números sobre a queda na mortalidade, aumento da frequência de crianças na escola, redução drástica do trabalho infantil certamente demonstram que o Estatuto da Criança e do Adolescente, que hoje completa 30 anos, transformou o Brasil num lugar melhor para uma criança crescer. Mas, por si só, não conseguem repassar a grandeza que foi, nestas últimas décadas, a construção de uma cultura de proteção a esse público. Esta é uma inegável vitória.

Por mais problemas que tenhamos, a criança hoje é vista, sim, como um ser de direitos, que deve ser protegida e amparada em conjunto pela família, sociedade e Poder Público. Resultado da Convenção Sobre os Direitos da Criança e do Adolescente, acordo ratificado por mais 196 países, o Eca nasceu em 13 de julho de 1990 e agora mostra toda transformação promovida na história de crianças e adolescentes, desde que a Lei nº 8.069/1990 estabeleceu os direitos e deveres de menores de 18 anos.

A mortalidade infantil foi reduzida com a realização de diversas campanhas de vacinação e soro caseiro, ações que derrubaram esses índices. Em 1990, morriam 47 crianças para cada mil nascidas vivas e, em 2017, 13,4. A escola obrigatória era até os 14 anos e, nesta faixa etária, 20% estavam fora dela. Em 2017, esta porcentagem caiu para 4,7%. Além disso, quando o Eca nasceu, apenas 64% das crianças eram registradas no seu primeiro ano de vida. Esse número passava dos 95% em 2013.

Se por um lado o Eca avançou do ponto de vista educacional, por outro ainda temos 2 milhões de crianças fora das salas de aula. Na saúde, voltamos a lidar com o sarampo, desnutrição e doenças mentais, fora a situação dos refugiados. Em 2019, de 200 mil venezuelanos que chegaram ao Brasil, 30% eram crianças. O suicídio entre esse público também cresceu e preocupa o número crianças e adolescentes de 10 a 19 anos assassinados no País. Só em 2017 foram quase 12 mil. Não é surpresa o fato de que a maioria é negra, pobre e vive na periferia das grandes cidades.

Mas nem todos esses problemas podem endossar uma tendência crescente de alteração no Eca para promover maior rigor nas punições aos menores infratores. É inegável que o sistema educativo é um desafio, visto que a maioria das unidades ainda não têm escolas e isso é fundamental para a mudança de comportamento dessas crianças e fazer valer esse tempo. Diante disso, é meu dever como magistrado, neste aniversário tão importante, defender que antes de alterar o Eca, possamos cumpri-lo integralmente.

Aristóteles, no Ano 600 ac, já dizia: “Educai a criança e não será necessário punir o homem”. Parece que isso foi dito ontem, porque é uma verdade eternizada no tempo.

Desembargador Walter Carlos Lemes
Presidente do Tribunal de Justiça do Estado de Goiás

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