O Município de Goiânia foi condenado a planejar, executar e construir galerias de captação e drenagem de águas pluviais, no prazo de 60 dias, para conter alagamento de ruas e avenidas do Jardim Europa. Deverá ainda ressarcir em R$ 40 mil um casal em virtude de o imóvel no qual residem ter sido parcialmente destruído pela força da enxurrada decorrente de fortes chuvas na região. A decisão é da juíza Patrícia Machado Carrijo, da 3ª Vara da Fazenda Pública Municipal e Registros Públicos da comarca de Goiânia, que entendeu que ficou caracterizada a omissão do município ao deixar de implementar políticas públicas imperiosas à resolução da questão.

Em dezembro de 2019, os proprietários, que moram no imóvel há mais de 30 anos, viram a casa sendo destruída em razão das fortes chuvas, situação agravada diante da falta de um sistema de drenagem pluvial da região, o que acarretou prejuízos de ordens materiais. Os moradores alegaram no processo que a enxurrada começa na região do Jardim Ana Lúcia, bem como ao longo da rua Paganini, com cruzamento da Avenida Itália.

Segundo eles, dias antes do ocorrido, a prefeitura realizou obra, como cortes nos meios-fios e aterro da avenida como forma de desobstruir as águas acumuladas ao longo do endereço, por causa do declive, e que descem e provocam destruição da camada asfáltica, invadem terrenos, arrancam terras e pedras e empurram para o leito da avenida Contorno Oeste, provocando alagamento das residências construídas às margens da via.

Ao ser citado, o Município de Goiânia apresentou contestação. Em síntese, diz que os fatos apresentados pelos requerentes não configuram relação de consumo, além de não caracterizar a responsabilidade subjetiva, ao que requereu a improcedência dos pedidos. Argumentou, ainda, que o evento danoso ocorreu por motivos alheios.

Sentença

Na decisão, a magistrada argumentou que resta incontroversa a ocorrência do evento danoso que trouxe prejuízos à parte autora, pela destruição parcial da residência, em razão de enxurradas que desaguaram no imóvel, conforme demonstraram as fotografias juntadas aos autos, como também boletim de ocorrência, entre outros documentos. “Nesse contexto, embora o município tenha alegado que o evento danoso seja decorrente das fortes chuvas que caíram na região, e fugiram dos padrões habituais, tenho que razão não lhe assiste. Contudo, não se trata de situação isolada, mesmo porque as provas juntadas aos autos, especialmente a mídia apresentada, demonstram que em janeiro de 2021 houve outro alagamento na região, causado pela força da enxurrada, que atingiu diversos imóveis em grandes proporções”, explicou.

Ressaltou que não há dúvida de que houve omissão estatal, de modo que não se trata de mero fenômeno natural. “A eventual atipicidade do volume de chuva havido naquele dia não tem o condão de isentar o Município de Goiânia do dever de indenizar os danos suportados, pois se afiguravam imperiosa a efetiva implementação de todas as políticas públicas aptas a debelar o infindável problema de escoamento urbano, que invariavelmente coloca em risco a população e, de tempos em tempos, lamentavelmente ceifa vidas e destrói tanto o patrimônio público quanto o privado”, sustentou a magistrada.

De acordo com a juíza, não se pode dizer que era imprevisível a ocorrência de chuvas fortes e, também, que as consequências destas chuvas eram inevitáveis pela municipalidade. “Oportuno destacar que o Município requerido não se desincumbiu do ônus de provar que tenha envidado todos os esforços possíveis e necessários para evitar que o evento danoso acontecesse, mesmo porque tinha conhecimento da situação de alagamento da região, além de possuir mecanismos de aferição de áreas de risco de alagamento e poder tomar as medidas preventivas para minimizar os riscos à população”, frisou.

Para a magistrada, ficou caracterizada a omissão do município ao deixar de implementar políticas públicas imperiosas à resolução da questão, demonstrando assim o nexo de causalidade da responsabilidade civil do Poder Público. Destacou ainda que é inegável o prejuízo experimentado pelos requerentes, de modo que devem ser reparados com a definição do quantum debeatur em liquidação de sentença.

Em relação ao dano extrapatrimonial, entendeu que está plenamente demonstrada, vez que a inundação do terreno pela enxurrada e destruição de parte da residência dos requerentes foram capazes, por si só, de ultrapassar a barreira do mero dissabor. “Não se pode afastar da premissa de que um bem imóvel, como é de conhecimento notório, é alvo de mais ampla proteção pelo ordenamento jurídico, sendo certo que a sua destruição por evento evitável (mas inesperado) representa abalo moral indenizável, especialmente pela angústia e aflição que passaram os requerentes diante da situação de inundação noticiada, a preocupação de ficarem sem a residência, os móveis e objetos que asseguravam o aconchego de seu lar”, finalizou a magistrada. Nº: 5389367-91.2020.8.09.0051 (Texto: Acaray Martins - Centro de Comunicação Social do TJGO)

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