091213Por unanimidade de votos, a 1ª Câmara Criminal do Tribunal de Justiça do Estado de Goiás manteve decisão que manda a júri popular Cleiton Pereira de Paula, Aparecido Jacinto do Carmo, Ricardo Rodrigues Machado e Durvalino Câmara dos Santos Júnior. Eles são policiais militares e acusados de matarem Lucimar Conceição de Neiva e Marcelo Alves dos Reis. O relator do processo foi o desembargador Nicomedes Borges (fotos).

Os quatro foram pronunciados (decisão que manda réu a júri popular) pela 2ª Vara Criminal da comarca de Goiânia pelos homicídios, com a qualificadora (circunstância que pode aumentar a pena) por uso de recurso que dificulte ou torne impossível a defesa da vítima. Eles interpuseram recurso em sentido estrito pedindo suas absolvições, alegando ausência de provas quanto à materialidade e autoria, ao afirmar que as provas periciais estão contaminadas, devendo ser retiradas dos autos. Argumentaram, também, que a denúncia não individualiza a conduta dos policiais, violando, dessa forma, o princípio da dignidade do ser humano, da proporcionalidade e do devido processo legal. Afirmam ter agido em legítima defesa e sob estrito cumprimento de dever legal e, alternativamente, requereram a exclusão da qualificadora.

O desembargador entendeu estar devidamente comprovada a materialidade do crime pelos laudos médicos. Sobre o pedido da realização de novas perícias, o magistrado afirmou que “não passa de medida procrastinatória”, portanto não deve ser acatado. Nicomedes constatou que “a defesa não logrou êxito em demonstrar onde os peritos estavam comprometidos, ao ponto de serem desacreditados”. Ele frisou que a prova técnica, realizada no curso da investigação policial, por peritos policiais, não foi questionada pela defesa e só está sendo questionada por conta do resultado penal desfavorável. Além disso, ele considerou que não houve cercamento de defesa no caso.

Nicomedes destacou que a denúncia “narra de maneira satisfatória a data e o local dos fatos atribuídos aos policiais, os quais foram devidamente qualificados, além de explicitar a adequação típica, o que deu ensejo ao exercício efetivo da ampla defesa de cada qual”. Dessa forma, para o desembargador, não há de se falar em inépcia da denúncia.

Quanto à alegação de legítima defesa e estrito cumprimento de dever legal, o magistrado levou em conta os laudos médicos para negá-la. É que a legítima defesa implica no uso moderado dos meios necessários, enquanto consta nos laudos que Lucimar foi atingido por sete disparos e Marcelo por três. Os peritos ainda constataram que, pelas lesões existentes em seus antebraços anteriores, eles se encontravam imobilizados no momento dos disparos. Além disso, os diferentes ângulos e trajetórias dos tiros determinam que eles foram atingidos quando se encontravam deitados. Desse modo, o desembargador entendeu que “os apelantes extrapolaram o dever legalmente imposto, pois para prender as vítimas, que tinham acabado de fazer um assalto, desnecessário seria matá-los”. Por fim, ele decidiu que as provas devem ser levadas à apreciação do júri.

O caso

Consta dos autos que no dia 12 de março de 2007, os policias que ocupavam duas viaturas da Rondas Ostensivas Táticas Metropolitanas (Rotam) foram informados de um assalto à mão armada nas proximidades do Buriti Shopping, em Goiânia. Eles se deslocaram para o local e encontraram os assaltantes Lucimar e Marcelo, algemaram-nos e determinaram que adentrassem às viaturas. Se dirigiram, então, a uma mata na Vila Rosa, onde mataram os dois.

A ementa recebeu a seguinte redação: "Recurso em sentido estrito. Homicídios qualificados. Preliminares: cerceamento de defesa – nulidade das provas colhidas no inquérito policial – inépcia da denúncia – não violação dos princípios constitucionais - todas vencidas. Absolvição sumária por legítima defesa e estrito cumprimento do dever legal – improcedência. Desclassificação para homicídio simples - não cabimento. 1) O indeferimento de produção de provas é ato norteado pela discricionariedade regrada do julgador, podendo ele, portanto, soberano que é na análise dos fatos e das provas, indeferir, motivadamente, as diligências que considerar protelatórias e/ou desnecessárias, nos termos preconizados pelo § 1º do art. 400 do Código de Processo Penal Incomportável a pretendida absolvição sumária, porquanto necessária prova certa da inexistência do crime ou de que o acusado não seja o autor do fato ou que agiu acobertado por uma excludente de ilicitude ou culpabilidade. 2 - A realização de prova pericial no curso do inquérito policial, distante do contraditório, ainda não estabelecido, não constitui nulidade que contamina a ação penal, porquanto a providência se inscreve no âmbito de atuação da Polícia Judiciária, em atividade reservada pelo artigo 6º do Código de Processo Penal, permitindo-lhe deflagrar a apuração do fato criminoso, de modo a implementar exames necessários à identificação do possível autor do delito. 3) Preenchidos os requisitos do artigo 41 do Código de Processo Penal e conferido ao acusado ampla defesa dos fatos que lhe foram imputados, não há se falar em inépcia da denúncia. 4) Se foi assegurado ao recorrente todos os meios recursais previstos, não se há falar em violação aos princípios da dignidade da pessoa humana, proporcionalidade, do devido processo legal e do contraditório. 5) Em face de haver nas provas a hipótese de que eram 4 (quatro) os autores do fato em exame e que uma das vítimas foi atingida por 7 (sete) disparos e a outra por 3 (três), quando tinham as mãos amarradas, não resta evidenciada a moderação ou a agressão injusta, não havendo a certeza, no presente momento, de que configurada a excludente da legítima defesa, ou a do cumprimento do dever legal, uma vez que para esta faltou a demonstração inequívoca de que o acusado Aparecido tenham agido de acordo com os limites traçados pela Lei. 6) Provada materialidade do fato e havendo indícios de sua autoria, impõe-se a pronúncia dos réus, cabendo ao Tribunal do Júri o julgamento da causa. 7) Por ser matéria diretamente ligado ao mérito da causa é impossível nesse momento processual a exclusão da qualificadora e a consequente desclassificação do crime para homicídio simples, devendo tal pedido ser reservado ao Júri. 8) Recurso conhecido e improvido." (Texto: Daniel Paiva - estagiário do Centro de Comunicação Social do TJGO)