Além do que conhecer amplamente a legislação, um operador do Direito precisa interpretar os fatos. E essa interpretação deve ser despida de preconceitos de sexo, raça, gênero, entre outros, que muitas vezes impedem uma análise humanizada dos acontecimentos. A opinião é da juíza auxiliar da presidência do Tribunal de Justiça do Estado de Goiás, Sirlei Martins da Costa, ao falar durante o 2º Congresso Multidisciplinar de Direito, nesta sexta-feira (27), no Centro de Convenções, em Goiânia.

Com o painel chamado Direito e Perspectiva de Gênero, a magistrada abordou a problemática da sociedade patriarcal e os reflexos dessa desigualdade em situações que fomentam vulnerabilidades. Além das disparidades entre os sexos, Sirlei Martins da Costa questionou o mito de que o Brasil é uma democracia racial, ao apontar para a ferida histórica de que o país é, além de machista, também racista.



“Nossas atuações e nossas decisões são moldadas por uma lente desde a nossa infância e, muitas vezes, sequer reconhecemos isso. É preciso ter consciência de que usamos essa lente forjada numa ordem patriarcal, racista e branca. Não basta saber o Direito para construir um Estado igualitário, é necessário entender que a sociedade reproduz arquétipos e retirar essas lentes de nossos olhos”.

Para embasar o discurso, a magistrada recorreu à antropóloga argentina Rita Segato. Durante a palestra, ela conta que a estudiosa desenvolveu um comparativo de como as sociedades situaram, ao longo dos séculos, a figura feminina sempre em um lugar desprivilegiado em relação à masculina, embasado em mitos e religiões, a exemplo de Adão e Eva, no qual a mulher é a culpada por todo o mal do mundo. “Não é uma questão meramente cultural, mas é uma ordem política de poder e desigualdade, na qual foi construído um estado patriarcal”, explica Sirlei Martins da Costa.



Essas “lentes”, como a juíza se refere desafiam o Direito e, para o exercício das funções judicantes, ela cita que o Conselho Nacional de Justiça (CNJ) desenvolveu o Protocolo para Julgamento com Perspectiva de Gênero, pela Portaria nº 27, em 2 de fevereiro do ano passado. “É um documento de extrema importância, não apenas para os julgadores, mas deve ser estudado por todos os operadores do Direito”, concluiu a magistrada. (Texto: Lilian Cury/ foto: Acaray Martins- Centro de Comunicação Social do TJGO)

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