O Supremo Tribunal Federal (STF) decidiu que os programas estaduais que preveem o adiamento do recolhimento do Imposto sobre Circulação de Mercadorias e Serviços (ICMS) não violam o sistema constitucional de repartição de receitas tributárias, desde que seja preservado o repasse da parcela pertencente aos municípios quando do efetivo ingresso do tributo nos cofres públicos estaduais. A decisão foi tomada no julgamento do Recurso Extraordinário (RE) 1288634, com repercussão geral reconhecida (Tema 1.172). Em maio de 2021, o Órgão Especial do Tribunal de Justiça do Estado de Goiás (TJGO) havia admitido Incidente de Resolução De Demandas Repetitivas (IRDR) sobre o assunto, com relatoria da desembargadora Beatriz Figueiredo Franco, que aguardava decisão da corte superior, por se tratar de matéria constitucional.

Na ocasião da admissão do IRDR pelo colegiado goiano, a relatora destacou que havia existência de dois precedentes qualificados sendo utilizados para reger as implicações dos incentivos fiscais instituídos pelos programas Fomentar e Produzir na arrecadação dos municípios onde estão sediadas as empresas aderentes. Trata-se dos temas 42 e 653, ambos de repercussão geral emitidos pela Corte Suprema. “Portanto, fácil concluir que há divergência na jurisprudência desta Corte, e que o presente incidente tem a vocação de saná-la. E o dissídio se repete mesmo no Supremo Tribunal Federal ao apreciar processos goianos gravitantes sobre os mesmos incentivos estaduais e a mesma irresignação dos municípios”, salientou a desembargadora relatora no substancioso voto apresentado.

Decisão

No caso em análise, o Município de Edealina (GO) questionava decisão do Tribunal de Justiça do Estado de Goiás (TJGO) que havia afastado a integração da isenção tributária no cálculo da cota municipal porque o benefício, previsto no Fundo de Participação e Fomento à Industrialização do Estado de Goiás (Fomentar) e no Programa de Desenvolvimento Industrial de Goiás (Produzir), fora concedido antes do recolhimento do tributo.

No recurso ao STF, o município alegava que o entendimento do tribunal estadual seria contrário à decisão do Supremo, também com repercussão geral (Tema 42), de que a retenção da parcela do ICMS constitucionalmente devida aos municípios em razão da concessão de incentivos fiscais configura interferência indevida do Estado no sistema constitucional de repartição de receitas tributárias.

Repartição de receitas

Ao votar pelo desprovimento do recurso, o relator, ministro Gilmar Mendes, verificou que o caso não se enquadra no Tema 42. Naquela ocasião, o Tribunal assentou que “a retenção da parcela do ICMS constitucionalmente devida aos municípios, a pretexto de concessão de incentivos fiscais, configura indevida interferência do Estado no sistema constitucional de repartição de receitas tributárias”. Porém, o ICMS já havia sido efetivamente arrecadado.

Os programas, visando ampliar a atividade industrial goiana, concedem aos beneficiários um suposto financiamento ou empréstimo, que consiste na redução do ICMS a ser recolhido no mês, com o pagamento do restante (70% no programa Fomentar ou 73% no Produzir) em parcelas subsequentes. Ou seja, a parcela tem o seu recolhimento postergado.

Assim, na avaliação do ministro, os valores ainda não podem ser considerados receita pública, pois o tributo não entrou, nem ao menos de forma indireta, no patrimônio do Estado de Goiás. “Eventual conclusão precoce pela obrigatoriedade de transferência apenas com base no ICMS escriturado, além de ferir a autonomia federativa dos Estados para a implementação de seus programas de benefícios fiscais, poderia impactar negativamente em seu equilíbrio fiscal”, disse.

Para ele, os programas goianos estão inseridos no contexto do Tema 653 da repercussão geral, em que o Supremo considerou constitucional a concessão regular de incentivos, benefícios e isenções fiscais relativos ao Imposto de Renda e ao Imposto sobre Produtos Industrializados pela União em relação ao Fundo de Participação de Municípios e as respectivas quotas devidas às municipalidades.

Tese

A tese de repercussão geral fixada foi a seguinte: “Os programas de diferimento ou postergação de pagamento de ICMS – a exemplo do Fomentar e do Produzir, do Estado de Goiás – não violam o sistema constitucional de repartição de receitas tributárias previsto no art. 158, IV, da Constituição Federal, desde que seja preservado o repasse da parcela pertencente aos Municípios quando do efetivo ingresso do tributo nos cofres públicos estaduais”. Ficou vencido o ministro Alexandre de Moraes, que votou pelo provimento do recurso. (Texto: Lilian Cury / Foto: STF- Centro de Comunicação Social do TJGO com informações do STF)

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